Dicas para produzir cogumelos em borras de café
Após uma empresa nos Estados Unidos ter lançado um kit de cogumelos em borras de café destinado ao público amador com carácter ecológico e didáctico há alguns anos atrás, tem havido um grande interesse do público amador e até profissional em produzir cogumelos neste substrato abundante no nosso país.
A grande vantagem das borras de café é ser um substrato já tratado e que no fundo já foi hidratado e pasteurizado pelo processo de torrefacção e extracção do café. A outra vantagem é ser um resíduo normalmente desaproveitado e através da produção dos cogumelos conseguimos a sua valorização e por isso é um processo considerado ecológico.
Embora a produção em borras de café pareça ter muitas vantagens, o aumento de escala para uma produção profissional torna-se pouco viável uma vez que para se obter maiores quantidades deste material é necessário recorrer a uma vasta rede de recolhas frequentes em vários estabelecimentos, o que faz com que esse substrato se torne mais caro do que outros equivalentes.
Há ainda que ter em conta que nem todas as espécies de cogumelos “gostam” de crescer em borras de café, apenas algumas espécies conseguem se desenvolver neste substrato, sendo a espécie mais comum, o cogumelo Pleurotus ostreatus. Outras espécies, como Hypsizygus ulmarius e Pleurotus djamor também é possível produzir pelo mesmo método. Espécies como o shiitake (Lentinula edodes) ou Hericium erinaceus não se conseguem produzir desta maneira.
Há uma chamada de atenção importante para quem tenciona utilizar este substrato, pois tem sido amplamente divulgado em vários meios de comunicação e workshops de algumas entidades a utilização de cartão como suplemento das borras de café para retirar o excesso de água e fornecimento de celulose. No entanto pode ser arriscado para a saúde humana utilizar o cartão, uma vez que este material poderá ter origem em papéis reciclados de origem desconhecida e consequentemente com potenciais contaminantes, nomeadamente metais pesados (tóxicos) que o fungo irá absorver e concentrar no cogumelo que será consumido. Por isso utilize preferencialmente apenas borras sem suplementos. Caso as borras sejam constituídas de café muito fino ou com excesso de água, mude de “fornecedor”…
Ainda assim, para quem quiser ter a experiência de produção e aproveitar as borras de café, aqui ficam algumas dicas:
- Recolher diariamente as borras para um saco limpo assim que saem da máquina
- Usá-las assim que possível (1 a 3 dias, máximo 7 dias)
- Se não for possível utilizar logo, refrigerar ou congelar
- Não há necessidade de pasteurizar nem esterilizar, depois arrefecidas, as borras estão prontas a serem inoculadas (“semeadas”) com o micélio (ou spawn “semente de cogumelo”)
- A quantidade média de micélio que se costuma utilizar é cerca de 5% do peso das borras, no entanto algumas pessoas para terem maior sucesso, utilizam até 10% do peso. Os produtores que produzem com regularidade e não têm problemas com contaminações podem utilizar entre 2,5% a 5%. Por exemplo, utilize entre 75g a 100g de micélio para um saco de 1,5Kg de borras para começar. A mistura das borras com o micélio deve ser o mais homogénea possível.
- Antes de inocular, lave e se possível desinfecte com álcool a 70% os materiais que vão entrar em contacto com as borras e o micélio.
- “Amasse” bem o saco de micélio em grão antes de abrir, de forma a separar bem as sementes umas das outras, depois utilize uma pá ou colher limpa para conseguir misturar muito bem, as borras e o micélio.
- A maioria das pessoas normalmente não tem borras suficientes para um saco de micélio que tem cerca de 2Kg . Mesmo sabendo que o saco fica logo contaminado depois de aberto, continua a ser viável utilizar o mesmo saco de micélio durante 1 a 3 semanas, uma vez que estas espécies que funcionam em borras de café têm algum grau de resistência a contaminações. Para isso é necessário voltar a fechar o saco após cada utilização. (Colocando uma mola a cima do filtro que os sacos de spawn trazem)
- Um aspecto muito importante é não esquecer que qualquer fungo respira, por isso os sacos ou outros recipientes, terão de ter um filtro (artesanal ou saco com filtro incorporado) ou ainda perfurar esse recipiente com dezenas ou centenas de pequenos furos. Não devem ser muito grandes nem deixar os sacos abertos, pois nesse caso podem ser rapidamente atacados por moscas minúsculas. Utilize de preferência sacos transparente para acompanhar o crescimento do fungo.
- No caso de não conseguir utilizar borras frescas ou tenha notado contaminações com outros fungos ao longo do processo, pode adicionar umas horas antes ou no dia anterior à inoculação cerca de 2% de cal viva ou cal hidratada em pó (sempre com os devidos cuidados com a cal).
- Como as borras de café são um material muito compacto e irá haver dificuldade de penetração do oxigénio no interior, evite de utilizar sacos ou recipientes finos e altos, assim como sacos muito grandes e nunca mais de 2Kg por saco.
- Depois do processo de inoculação, os sacos seguem o processo normal da produção de cogumelos. Vão incubar num local com a temperatura adequada, funciona normalmente entre os 15ºC e os 25ºC), mas o melhor é confirmar os parâmetros de produção para a estirpe (variedade) utilizada (na nossa página pode retirar o PDF das várias estirpes)
- Como as borras são muito escuras, nem sempre os sacos ficam com o aspecto branco típico de outros substratos como palhas e serraduras. Mas quando os sacos ficarem num bloco sólido e se notar que o micélio cresceu por todo o saco, aí está na altura de colocar a frutificar.
- No caso dos Pleurotus ostreatus é muito simples, pois basta abrir 1 ou dois cortes em “X” nos sacos e colocar num local com luz, mas abrigado da luz directa do sol e do vento e os cogumelos irão nascer.
- Outra dica importante é não regar/borrifar os cogumelos. Pois eles gostam de humidade ambiente mas não de água sobre os seus chapéus. A água sobre os chapéus pode evitar que desidratem, mas dificulta o seu desenvolvimento e facilita o desenvolvimento de microrganismos nos cogumelos que vão contribuir para deformações e má aparência. Borrifar ou regar os cogumelos será uma solução de último recurso, em situações de temperaturas elevadas e humidade baixa e que pode nem funcionar.
- Para aprofundar detalhes na produção de cogumelos em substratos tratados (onde também incluímos as borras de café), na nossa empresa organizamos pontualmente alguns cursos.
Para quem quiser ter apenas a experiência só da parte da frutificação ou oferecer a alguém uma caixa bonitinha, então o mais fácil será recorrer aos vários kits prontos a produzir que já existem no mercado.
Boas produções em borras de café!
(Actualização 21/10/2019)
Caso tenha interesse em acções de formação para produções domésticas de cogumelos, consulte a minha nova página em: www.cogumelos-biotech.pt
Rui Coelho